Em 1978, a principal razão que organizou os artistas de São Miguel Paulista em torno do Movimento Popular de Arte – MPA, foi a luta pela reforma e restauração da Capela Histórica e a sua transformação em um Centro Cultural dinâmico e aberto para a população que funcionasse como polo aglutinador e irradiador da arte e cultura produzida na região. Para sensibilizar e envolver os moradores do bairro na proposta de transformação da capela em centro cultural foram desenvolvidas diversas ações na época, como por exemplo, ocupação da capela com mostras e programações artísticas e culturais, abaixo-assinados, manifestos, tratativas e negociações com o estado e com a igreja, culminando com um última reunião envolvendo MPA, estado e igreja, quando foi oficializada a negativa da igreja, proprietária da capela, à reinvindicação dos produtores culturais de São Miguel.
Com o não da igreja e passada a fase da ocupação da capela, o MPA ficou no olho da rua feito cachorro caído do caminhão de mudança. E agora? O que fazer e para onde ir? O jeito era ocupar as ruas e praças do bairro e os parceiros preferenciais seriam os setores organizados da população: comunidades de base, sociedades amigos e movimentos sociais e sindicais. Foi criada então, a Praça Popular de Arte, evento cultural que era realizado em praça pública e dividido em 03 partes: de manhã – atividades infantis; à tarde – evento com exposições de artes plásticas, fotografia, varal de poesias, shows musicais e espetáculos teatrais com grupos do bairro e de outras regiões e cidades; e à noite – um forró geral com sanfoneiros da região, evento aliás, que deu origem à Praça do Forró.
O Periferida nasceu meio por acaso nesse contexto e pela necessidade nos dias de Praças de Arte, de contatar e atrair as crianças do em torno das praças para as atividades infantis preparadas. Algumas pessoas que gravitavam meio sem função definida em torno do MPA, poetas, músicos desgarrados, pintores ou simplesmente malucos simpatizantes da causa, resolveram montar uma peça infantil de rua do Teatro Núcleo chamada a Ilha do Patropi, para atrair a criançada com um cortejo teatral e musical pelas ruas ao redor das praças onde seriam realizados os eventos. Posso dizer que o Periferida nasceu cantando:
“numa ilha bem distante
as pessoas são iguais
enroladas em barbante
embrulhadas em jornais
por causa de um rei – REI!
que agora é a lei – LEI!
por causa de um rei – REI!
seu nome eu não sei – SEI!”
O que no princípio era brincadeira acabou ficando sério, os porralouca do Ilha do Patropi tomaram gosto pela coisa, compraram os “100 exercícios”, do Boal, conseguiram com o SOF – Serviço de Orientação à Família, uma entidade que atuava junto à gente carente do bairro, uma sala para ensaios e criaram o Núcleo Teatral Periferida, pronto, ponto e era 1979. Método? Se tinha até hoje eu não sei, muita intuição, talvez, e uma pá de criaturas generosas e geniais: Fátima Bugolin, Geraldo Castro, Artênio Fonseca genio genial, Marlene e Edmirson Rodrigues, Mestre Dáio de Capoeira, Jorge Gregório - o Gueguê, Edna Bugolin, João Batista Muniz, Comadres Ivonês e Zefinha, Akira Yamasaki, Sueli Kimura, Juarez Santos, Neuza Munhoz, os meninos Levi, Marivaldo e Moacir, Edsinho Tomaz e Zé Paes.
Durante sua breve existencia, de 1979 a 1985, o Periferida montou 03 peças de teatro, a saber, o Ilha do Patropi – infantil de autoria do teatro Núcleo; o Canção Pequena Para Ninar Um Menino Morto – adulto, uma colagem de textos, poemas e músicas de vários integrantes do MPA; e o Soldado Jesus – adulto de autoria de Artênio Fonseca. Nesse período o grupo cumpriu uma rotina de atuações em parceria com movimentos sociais e entidades que compunham o espéctro de resistencia à ditadura militar, em palcos improvisados em ruas, praças, igrejas, sociedades amigos de bairro, comunidades de base e sindicatos de trabalhadores.
Acho que o Periferida terminou em 1985 porque já não havia uma proposta que unificasse os seus integrantes, seja de ordem ideológica ou estética; porque os tempos já eram de construção e não de resistencia; e também porque a água começou a bater na bunda, família, filhos, escola, médicos, remédios, aluguel, despesas, contas para pagar. Sobrevivencia.
Akira – 15/01/2010.
3 comentários:
O livro do Boal que o Akira se refere era "200 exercícios e jogos para o ator e o não-ator"
Amigos, devo confessar que estou de olho no "soldado Jesus" (lá ele!).
Há uma grande chance de ser produzida pelo AD ainda este ano, após 'Drácula'. O texto está disponível no blog do Artênio Fonseca, um dos nossos indicados.
Seria bacana uma releitura de um espetáculo de um grupo teatral de São Miguel antecessor do nosso. Pelo que ouvi dizer, um clássico local. E olha que clássico é comigo mesmo!
Dentre as pessoas que passaram pelo Perferida esqueci uma, de forma imperdoável: Euzélia Santana.
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